Usar filhos como instrumento de vingança pelo fim da vida conjugal é crime. E não importa se são os pais, avós e até mesmo os novos parceiros quem manipula psicologicamente a criança contra o pai ou a mãe, seja voluntariamente ou não, bem como dificulta o convívio familiar.
De acordo com a advogada Edwirges Rodrigues, professora de direito de família na Unesp e membro do IBDFAM, a lei 13.431/2017, em vigor desde abril deste ano, considera os atos de alienação parental como violência psicológica e assegura ao genitor alienado o direito de pleitear medidas protetivas contra o autor da violência.
O alienador não pode ser preso, mas pode receber punições como uma advertência, pagamento de multa e modificação da guarda para compartilhada ou sua inversão. Quando descumprida a medida protetiva que assegure, por exemplo, o exercício da guarda compartilhada, além de o juiz decretar a prisão preventiva do infrator – pai, mãe ou responsável –, ele fica sujeito a processo criminal.
Outra novidade nesta área é que, em julho, a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu a síndrome da alienação parental como uma doença dentro da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, mais conhecida como CID. “Agora que o problema é literalmente tido como uma doença, pode ser que os profissionais envolvidos, e até mesmo os pais, passem a ter maior conhecimento, cuidado e atenção com a prática de tais atos, a fim de impedi-los”, diz o advogado Lucas Marshall Santos Amaral.
O que acontece com a criança vítima de alienação parental?
Não é possível prever quais os desdobramentos na vida de uma criança que passa por essa situação. Mas, segundo a psicóloga Patricia Bader, coordenadora do serviço de psicologia do Hospital São Luiz (SP), quanto mais tempo o caso persistir, pior é. E quanto mais cedo a criança passa por isso, também. “Quanto mais nova, menos recursos afetivos para lidar com o trauma”, diz a psicóloga. Não existe um critério para identificar a alienação parental, mas como ela mexe muito com a criança, alguns sinais ajudam os pais a perceber que algo não está bem.
- É comum a criança manifestar muita raiva em relação ao genitor que está sendo excluído. Ela passa a não querer mais encontrá-lo, recusa-se a fazer contato e pode falar coisas que não são próprias do discurso da sua idade – como “estou brava com o meu pai, pois ele não pagou a parcela da pensão”
- Fica doente com mais frequência.
- No caso de crianças de até 8 anos, a reação é muito mais comportamental do que verbal. “Em vez de conversar, ela fica triste, chora, nega a presença do outro”, explica Patricia.
- A criança fragilizada com o conflito entre os pais pode ficar mais ansiosa
- Ela também pode se sentir deprimida.
- A alienação parental pode deixar a criança com baixa auto-estima, por achar que o que está acontecendo é culpa dela. Por isso, por mais que os pais estejam magoados um com o outro, não devem expor seus problemas mal-resolvidos para os filhos, nem usá-los como moeda de troca.
Alienação parental: o que fazer para resolver a questão?
Para o pai ou a mãe que está sendo “agredido”, a recomendação é manter sempre o canal de comunicação aberto com o filho. Segundo Patricia, a melhor forma de mostrar que a fala do ex-companheiro não faz sentido é por meio de ações. “Seja coerente na forma de agir e demonstre com seus atos que eles podem confiar em você”, recomenda a psicóloga aos pais com esse problema.
A boa notícia para quem está passando por isso é que as coisas podem melhorar. Terapia é uma das intervenções possíveis. Mas atenção: se os pais estão com problemas, não basta achar que uma psicóloga vai ajudar a criança a passar por essa fase.
O pai e a mãe também precisam procurar acompanhamento. Outra possibilidade é fazer terapia familiar ou um esquema de visitas assistidas (quando uma pessoa de fora acompanha o encontro entre filhos e pais). Em casos extremos, resta recorrer à Justiça para resolver o problema.
Outra dica é seguinte, é comum encontrarmos falhas de comunicação, que têm o potencial de desencadear diversos tipos de problemas, bem como conflitos de relacionamento, e uma comunicação falha pode desencadear a alienação parental, por isso é muito importante que a comunicação seja assertiva. Mensagens mal interpretadas, conversas e feedbacks realizados de maneira inadequada, entre muitas outras situações, são capazes de se transformarem em verdadeiros obstáculos para um relacionamento saudável e equilibrado.
Quando o juiz precisa estabelecer os limites
Sim, alienação parental pode ser caso de Justiça e gerar uma ação judicial na Vara da Família. Se você acha que precisa de ajuda, a primeira coisa a fazer é procurar um advogado especializado. Segundo a advogada Juliana Cezaretto Fernandes, você também precisará juntar provas de que as atitudes do seu ex-companheiro (ou da sua ex-companheira) são prejudiciais para seu filho e para você mesmo, como desenhos feitos pela criança ou vídeos. Não ter uma prova física não impede a abertura do processo. A única coisa que pode acontecer nesse caso, segundo Juliana, é a audiência se transformar em um bate-boca dos pais, já que fica a palavra de um contra a palavra do outro.
De qualquer maneira, assim que seu caso chegar a um juiz, ele provavelmente pedirá uma perícia médica e laudo psiquiátrico para saber se é realmente um caso de alienação parental e quão grave é a situação. As sentenças vão desde nomear um psicólogo para acompanhar a criança e conciliar os pais até perda da guarda, nos casos extremos.